"Cometemos fatalidades,
querido. Crimes e absurdos.
Resmungamos demais; vivemos a terceira guerra
mundial por bobeirinha; ficamos nomeando nossos filhos, mas para quê?
Nem
sabemos se teremos filhos.
Deveríamos deixar os dias passarem, as madrugadas
nos acordarem, esses lençóis nos consumirem. Cúmplices de um crime perigoso:
Ouvi dizer, certa vez, que as pessoas gritam e esbravejam
durante discussões porque sentem a distância que estão criando um do outro.
Gritam para preenchê-la, para alcançar o outro...
E nesse momento me pergunto o que nosso silêncio significa.
Então estremeço com a resposta que me vem a mente, olho pra
você...
E simplesmente não posso acreditar que seja isso, que
estejamos desistindo de nós.
Talvez a culpas tenham sido jogadas vezes demais para ainda
causar remorso. Como quando nossas mentes se acostumam com determinadas dores
e, de alguma maneira, produzem anestesia própria.
Talvez tudo aquilo que pensamos ter enterrado, o passado que
juramos ter deixado, tenha só se fingido de morto pra despertador mais forte,
mais paralisante.
E ficamos assim, com palavras que chegam ao céu da boca e
até mesmo nos atrevemos a abrir a boca pra dizer... mas, que nós voltamos a
engolir com medo de um deslize fazer ainda mais estrago.
Como um sopro em um castelo de cartas.
Então, antes que qualquer um de nós dois saiba exatamente o
que estou fazendo...
Eu beijo você.
Suave e intensamente ao mesmo tempo.
Com dor e amor... ao mesmo tempo.
E é provavelmente o beijo mais cheio de saudade da história
do mundo.
Mesmo que você esteja ai e eu aqui, a poucos centímetros de
distância um do outro, eu sinto saudade. Sinto tanta, tanta saudade...
Saudade da gente.
Uma falta dolorosa daquela bagunça mais organizada que
éramos, que agora se tornou esses escombros sob os quais tentamos nos mover com
cuidado e alcançar a superfície... mas, que cada tentativa de se salvar só
causa novos ferimentos.